sábado, 26 de janeiro de 2013

O Existencialismo

    O Existencialismo é um conjunto de doutrinas filosóficas que tiveram como tema central a análise do homem em sua relação com o mundo, em oposição a filosofias tradicionais que idealizaram a condição humana. 
     Foi também o Existencialismo um fenômeno cultural que teve seu apogeu na França do pós-Guerra até meados da década de 1960, e que envolvia estilo de vida, moda, artes e ativismo político. Como Movimento popular a filosofia existencialista iria também influenciar também a música a partir dos anos de 1970. Apesar de sua fama de pessimista e lúgubre, o existencialismo  na verdade, é apenas uma filosofia que não faz concessões: coloca sobre o homem toda a responsabilidade por suas ações.
       O principal pensador da filosofia existencialista no século XX foi o francês Jean-Paul Sartre (1905-1980), que inicialmente era um discípulo da fenomenologia, e suas primeiras obras, como "A imaginação(1936) e "Esborço de uma teoria das emoções (1939), foram escritas com base nessa influência. É a partir de romances como "A náusea (193) e "Os Caminhos da Liberdade (1944-1949), de peças de tatro como "As Moscas (1943) e " Entre quatro paredes" 91945, bem como de obras teóricas como "O Ser e o nada" (1943), que ainda traz como subtítulo " Ensaio de ontologia fenomenológica" e sobretudo "O Existencialismo é humanismo (1946), que começa a desenvolver sua filosofia existencial.



Sartre afirma que o existencialismo é uma doutrina que torna a vida humana possível e que, por outro lado, declara que toda a verdade e toda ação implicam um meio e uma subjetividade humana. Há duas espécies de existencialismo, aqueles que se declaram cristãs e, por outro lado, aqueles que se declaram ateus, que tem como principio que, como diria o próprio Sartre. " existência precede a essência ou, se quiser, que temos de partir da própria subjetividade."
Assim não somos a priori um projeto pensado, mas que somos apenas a posteriori, isso que dizer, primeiro existimos e depois definimos nossa essência. porém Sartre critica o existencialismo cristão, já que a partir do momento que concebemos um Deus criador, esse Deus identificamo-lo quase sempre com um artífice superior e se admitimos que a vontade segue mais ou menos uma  intenção, uma inteligência, Deus quando cria sabe perfeitamente o que cria, o que torna impossível que, neste caso, a essência preceda a existência. por outro lado havia o ateísmo dos filósofos do século XVIII, que mesmo suprimido a noção de Deus, continua com a concepção de que a essência precede a existência a partir do momento que concebe a idéia de uma natureza humana. 

“O existencialismo ateu, que eu represento, é mais coerente. Declara ele que, se Deus não existe, há pelo menos um ser no qual a existência precede a essência, um ser que existe antes de poder ser definido por qualquer conceito, e que este ser é o homem ou, como diz Heidegger, a realidade humana. Que significará aqui o dizer-se que a existência precede a essência? Significa que o homem primeiro existe, se descobre, surge no mundo; e que só depois se define. O homem, tal como o concebe o existencialista, se não é definível, é porque primeira não é nada. Só depois será alguma coisa e tal como a si próprio se fizer. Assim, não há natureza humana, visto que não há Deus para a conceber. O homem é, não apenas como se concebe, mas como ele quer que seja, como ele se concebe depois da existência, como ele se deseja após este impulso para a existência; o homem não é mais que o que ele faz.”

Esse é o primeiro princípio do existencialismo, o que é chamado de subjetividade, que sempre deixa uma opção de escolha e escolhendo o homem se escolhe:


“O homem primeiro existe, ou seja, que o homem, antes de mais anda, é o que se lança para um futuro, e o que é consciente de se projetar no futuro. O homem é, antes de mais nada, um projeto que se vive subjetivamente, em vez de ser um creme, qualquer coisa podre ou uma couve-flor; nada existe anteriormente a este projeto; nada há no céu inteligível, o homem será antes mais o que tiver projetado ser. Não o que ele quiser. Porque o que entendemos vulgarmente por querer é uma decisão consciente, e que, para a maior parte de nós, é posterior á aquilo que ele próprio se fez. Posso querer aderir a um partido, escrever um livro, casar-me; tudo isso não é mais do que a manifestação duma escolha mais original, mais espontânea do que o que se chama vontade. Mas se verdadeiramente a existência precede a essência, o homem é responsável por aquilo que é. Assim, o primeiro esforço do existencialismo é o de pôr todo homem no domínio do que ele é e de lhe atribuir a total responsabilidade da sua existência.”


Nesse sentido Sartre afirma que o homem não é apenas restritamente responsável pela sua individualidade, mas que é responsável por todos os homens. A subjetividade tem dois sentidos, por um lado quer dizer, escolha do sujeito individual; e por outro, é a impossibilidade de superar a subjetividade humana, e é esse segundo que é o sentido profundo do existencialismo. Quando diz-se que o homem escolhe a si próprio, nessa escolha também escolhe ele todos os homens. Com efeito, não há dos nossos atos um sequer que, ao criar o homem que desejamos ser, não crie ao mesmo tempo uma imagem do homem como julgamos que deve ser. Escolher isto ou aquilo é afirmar ao mesmo tempo o valor do que escolhemos, porque nunca podemos escolher o mal, o que escolhemos é sempre o bem, e nada pode ser bom para nós sem que o seja para todos. Assim a nossa responsabilidade é muito maior do que poderíamos supor, porque ela envolve toda a humanidade. Toda essa responsabilidade gera angústias, desespero, abandono, o homem é angústia a partir do momento que se descobre como Ser no mundo, responsável por si mesmo e ao mesmo tempo responsável por toda humanidade, já que se escolhendo escolhe para toda humanidade. Isso não significa que todo ser viva submerso em angústias, justamente porque acreditam que ao agirem só se implicam nisso a si próprios, e se justifica qualquer atitude na justificativa de que “nem todo mundo age assim”, uma atitude de má fé, quando o que está em jogo é justamente se todo mundo agisse assim. O fato de mentir de tal maneira implica que esse alguém não está à vontade com a sua própria consciência e o ato de mentir implica novamente num valor universal atribuído pela escolha. Mas quem me deu o direito de impor minhas concepções, meus valores a toda humanidade? Terei eu o direito de agir de tal modo que a humanidade se regula pelos meus atos? Isso é angústia, a responsabilidade não só por mim. Para Sartre a angústia não leva a inatividade, pelo contrário, essa angústia é a própria condição da ação, que se orienta pela pluralidade de possibilidades; e quando escolhem uma opção se dão conta de que ela só tem valor por ter sido escolhida. 

De acordo o pensamento de Dostoievski - “Se Deus não existisse, tudo seria permitido”, -  o homem está abandonado, já que não encontra em si e nem fora si, uma possibilidade que se apegue. Estamos sós e sem desculpas, porém se nossa existência precede a essência, isso nos torna inteiramente responsáveis por nós mesmos e pela humanidade. O existencialista nunca irá utilizar um impulso, uma paixão como desculpa para justificar sua atitude, pensa-se que ele é responsável por sua paixão; e jamais pensará que o homem pode encontrar auxílio num sinal dado sobre a terra, e que o há de orientar; porque pensa se que o homem irá interpretar tal sinal como quiser. A doutrina existencialista afirma que só há realidade na ação, o oposto ao quietismo:
“O homem não é senão o seu projeto, só existe na medida em que se realiza, não é, portanto, nada mais do que o conjunto dos seus atos, nada mais do que a sua vida.”

Assim sendo o homem só é na medida em que se realiza, na total responsabilidade de si mesmo, se é herói ou covarde, gênio ou medíocre, este é inteiramente responsável a medida que sua essência é posterior a existência. Se o indivíduo escolhe deixar-se ser levado, ser levado é uma escolha. Contrário aos críticos que afirmam que o existencialismo é uma doutrina pessimista, defende Sartre que é justamente o contrário, visto que o destino dos homens está em suas próprias mãos. 

O ponto de partida do existencialismo é subjetividade do indivíduo, justamente por ser uma doutrina baseada na verdade, porém realista, contrária a teorias utópicas, bonitas, baseada em esperanças, mas sem fundamentos reais. Não há outra verdade senão está: penso, logo existo; é aí que se atinge a si próprio a verdade absoluta da consciência. Toda teoria que considera o homem fora deste momento, não passa de uma teoria que suprime a verdade. E através do cogito, não descobrimos somente a nós próprios, mas descobrimos também aos outros. Só podemos nos descobrir em face do outro e o outro é tão certo para nós como nós mesmos; e assim descobrimos que o outro é a condição da nossa existência. Dá-se conta de que não pode ser nada, salvo se os outros o reconhecem como tal, ou seja, para obter uma verdade qualquer sobre mim é necessário que eu passe pelo outro. Nestas condições, afirma Sartre, que a descoberta da minha intimidade descobre-me ao mesmo tempo o outro como uma liberdade posta em face de mim, que nada pensa, e nada quer senão a favor ou contra mim. Isso é chamado de intersubjetividade, é neste mundo que o homem decide sobre o que ele é e o que são os outros.

O existencialismo é um humanismo, afirma Sartre, pelo simples fato de que o homem está constantemente fora de si mesmo, é projetando-se e perdendo-se fora de si que ele faz existir o homem e, por outro lado, é perseguindo fins transcendentes que ele pode existir. Não havendo outro universo senão o universo humano, o universo da subjetividade, existindo, o homem permite que o outro exista, uma co-dependência.  E é esta condição transcendente que estimula o homem e faz com que este não esteja fechado em si mesmo, mas presente sempre num universo humano, chamado de universo existencialista. Humanismo, porque não há outro legislador além dele próprio, e que é no abandono que ele decidirá de si, mas voltando sempre para fora de si, vivendo o mundo dos meios, porém buscando fora de si um fim.


Referências:
O Existencialismo é um Humanismo - Jean Paul Satre, 1946.


Palestra do Professor Franklin Leopoldo e Silva




domingo, 23 de dezembro de 2012

Dica de Filme: O Leitor


Inspirado no romance homônimo, de Bernhard Schlink, o longa-metragem começa na Alemanha em reconstrução do pós-guerra. Michael Berg (David Kross) é um jovem de 15 anos que no caminho para casa passa mal e é ajudado por uma mulher (Kate Winslett). No fim do seu período de convalescência, ele volta à casa dela para agradecer e os dois acabam juntos, na cama. O romance dura o verão e, sempre muito reclusa e até mesmo dura, Hana só lhe pede uma coisa antes do sexo, que ele leia para ela. Daí o título do livro e do filme.
Quando - sem avisar - ela some sem deixar pistas, o garoto sofre e amadurece. Passam-se os anos e agora ele é um estudante de direito. Orientado por um dos seus professores ele e seus colegas vão acompanhar o processo de ex-oficiais da SS que estão sendo julgadas pela morte de prisioneiras judias. E sentimentos que ele achava que estavam no passado voltam para lhe assombrar.Porém, mais do que o romance entre os dois, a obra tenta mostrar ao público o que foi ter nascido na Alemanha depois da Segunda Guerra Mundial, todas as discussões éticas que vêm dessa época e os traumas também. 
Quando um rofessor de direito diz que as sociedades se organizam por leis e não por conceitos morais, entrega a chave para se começar a destrinchar o que realmente há de profundo em "O Leitor" do diretor inglês Stephen Daldry. 
O filme tem um olhar atento e menos maniqueísta, absolutamente subjetivo sobre a responsabilidade moral de cada um. E a pergunta que subjetiva essa questão e lhe dá a dimensão real de sua complexidade da vida cotidiana é: "O que você teria feito no meu lugar?"
Assim essa pergunta é a linha divisória entre o conforto da acusação de quem não estava lá e a realidade atroz de quem estava. Ainda que nada, em qualquer instância, justifique o horror promovido pelo regime nazista e do Holocausto, tampouco se pode julgar àqueles que, com maior ou menor incisão, participaram dele lançando mão apenas de qualquer superficialidade simplista e maniqueísta.
Durante o julgamento de membros da SS, nos anos 60, Michel vê Hanna assumir sozinha a autoria de um documento que responsabilizar pela morte de 300 judeus. Ela só assume esse fardo por vergonha de revelar um segredo íntimo. Preferir ser punida.  Michel agora estudante de direito sabe do segredo e se vê no dilema de intervir no julgamento em defesa de uma acusada de nazismo, ou calar-se e deixar que ela assuma uma culpa que ele sabe não ser dela.
Pode a mulher amada ser um monstro? Quais são os limites do dever? Certos segredos devem ser mantidos? Essas são alguns dos questionamentos levantados pelo longa. Para Hanna, era mais importante ter seu segredo guardado do que se responder pela morte de inocentes?
A no filme toda essa complexidade, no que tange ao dever ou à responsabilidade moral, é sem dúvida o ponto forte do filme "O Leitor". Fazendo assim um contraponto com o campo filosófico, psicológico e principalmente histórico.
As feridas do povo alemão de lidar com o estigma do nazismo é provocante no filme . Pois como uma nação pode se recuperar de uma tragédia como o Holocausto? Como todo um país pode se esquecer de que, em função de um projeto nacionalista exaltado de recuperar o brilho do passado, acabou instalando um regime totalitário e racista como o nazismo e consequentemente o extermínio de mais de seis milhões de pessoas? 
Assim o advogado melancólico Michael representaria metaforicamente o povo alemão ao sofre da incapacidade de fazer aquilo que Hanna revela fazer tão bem: Evitar pensar no passado.
E, com isso, Michael vive eternamente a angústia de saber que, como tantos alemães, cometeu o terrível pecado de saber e nada fazer a respeito, sendo omisso e ao mesmo tempo cúmplice. Seja com o segredo de Hanna ou pelas atrocidades promovidas pelo nazismo. Fica a reflexão e a polêmica para a história.



Trecho do Filme:

Trailer do Filme "O Leitor"

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Os Filhos da Teologia da Libertação


Imagine a seguinte conjuntura política: ditaduras militares apoiadas pelos Estados Unidos em inúmeros países da América Latina. O período? Fins da Guerra Fria, década de 1980. Os potenciais “inimigos” do Tio Sam? Grupos guerrilheiros e partidos de esquerda. Certo? Errado. Para a CIA, “a Teologia da Libertação e as suas células conhecidas por CEBs (Comunidades Eclesiais de Base)” eram, há 30 anos, os reais agentes capazes de “desestabilizar” a região.
De acordo com o documento redigido pelo governo Reagan à época, conhecido como “Santa Fé II”, elaborado na cidade de mesmo nome, situada no Novo México, ambas representariam “uma doutrina política disfarçada de crença religiosa, com um significado antipapal e antilivre empresa, destinadas a debilitar a independência da sociedade frente ao controle estatal”. Ou seja, em outras palavras, “estariam a serviço do comunismo”, ou melhor, contra o capitalismo.
Setembro de 2010. O “perigo comunista” da Teologia da Libertação ressurge em noticiário nos Estados Unidos. O apresentador populista da Fox News, Glenn Beck, poucos dias após acusar Obama de socialista e de ser “um muçulmano que odeia os brancos” –    em xenofóbico discurso ao lado de Sarah Palin, realizado de forma ultrajante no mesmo local e dia que, em 28 de agosto de 1963, Martin Luther King pronunciou o seu célebre discurso “I have a dream” –, muda de estratégia e volta a afirmar que Obama é cristão, mas o acusa de “algo pior”: seguir os ensinamentos “demoníacos” da Teologia da Libertação.
Com os olhos fixos na câmera, durante entrevista para a própria Fox News, Beck incita seus telespectadores: “Pergunte a qualquer um na Igreja Católica, eles viram, é marxismo fantasiado de religião. E aconteceu na América do Sul”. Num macarthismo anacrônico – para não dizer risível –, o teor de suas palavras e a sua expressão facial viajam no tempo como uma reencenação piorada daquela cena clássica do filme (subliminarmente anticomunista) Invasion of the Body Snatchers (1956), na qual o personagem principal grita histericamente para quem possa ouvi-lo para que não confiem nem em seus próprios vizinhos (pois estes podem ser “um deles”, sem que você nem desconfie).


Marxismo como instrumento
Tirando o fato concreto de que uma busca na página do World Factbook da CIA 2010 ainda revele que, sob o tópico “grupos de pressão política”, encontram-se na mesma categoria tanto a Igreja Católica e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), no Brasil, quanto o Taleban, no Paquistão, e o Exército de Libertação Nacional (ELN) e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), no país vizinho, há muito de ficção quando se associa diretamente a Teologia da Libertação ao comunismo marxista e não este último e a própria Teologia da Libertação ao assim chamado cristianismo primitivo – época que se inicia com a morte de Jesus e vai até o ano de 325, quando Constantino transforma o Cristianismo em religião oficial do Império Romano.
Isso porque o que há na Teologia da Libertação, além da inspiração nos chamados primeiros cristãos, é o uso seletivo e crítico do marxismo como instrumento de análise para desvendar os mecanismos que levam as sociedades a terem estruturas econômicas e sociais injustas, com o intuito de demonstrar ao cristão como ele deve agir no mundo. Elementos como o ateísmo materialista, por exemplo, são rejeitados, e outros, assimilados, como a crítica do capitalismo e do poder das classes dominantes, a inevitabilidade do conflito social e a perspectiva da auto-emancipação dos explorados.
Na mesma lógica, Leonardo Boff, um dos principais teólogos da libertação, em seu livro O Caminhar da Igreja com os Oprimidos (1980), rejeita o materialismo dialético, mas reconhece o valor científico e político do materialismo histórico, como método que permite denunciar as falsificações ideológicas do capitalismo, e dar conta das verdadeiras causas que geram o empobrecimento. Diz ele: “Quando agentes pastorais mergulham no mundo cultural do pobre, não deixam de encontrar o marxismo, não como filosofia materialista e negadora de Deus, mas como o único instrumento a seu alcance para entender sua condição de explorados e como um caminho de organização, de formação de consciência crítica e de mobilização dos setores populares”.
Boff, ainda em outro livro, de co-autoria com seu irmão Clodovis Boff, Como fazer Teologia da Libertação (1986), detalha melhor essa afinidade eletiva: “Na Teologia da Libertação, o marxismo não é tratado como uma matéria em si mesmo, mas sempre da sua relação e em relação ao pobre. [Assim,] colocando-se firmemente ao lado dos pobres, teólogos da libertação questionam Marx: 'O que você pode nos dizer sobre a situação de pobreza e sobre os meios para superá-la?' Aqui, os marxistas são submetidos ao julgamento dos pobres e à sua causa, e não o contrário”.
Cristianismo Primitivo
Por outro lado, a associação entre os primeiros cristãos e as CEBs – comunidades compostas por membros das classes populares que, morando no mesmo bairro, se encontram para refletir e transformar a realidade, por meio do método ver-julgar-agir, a partir da leitura da Bíblia em articulação com os problemas reais da vida cotidiana – é repleta de sentido, já que entre os primeiros a “novidade” que chamava a atenção era que todos, pensando no bem-estar coletivo, usufruíam de seus bens em conjunto e haviam coletivizado a posse das coisas.
Tal ineditismo de conduta aliado a um constante ambiente de perseguições, viria a ser destacado por Engels, muitos séculos mais tarde, em 1894, no seu O Cristianismo Primitivo, texto no qual o parceiro de Marx enxerga pontos notáveis de contato entre a história do cristianismo primitivo e a do movimento proletário moderno: “Tal e qual o movimento proletário moderno, o cristianismo era em sua origem a expressão dos oprimidos e se apresentava primeiramente como a religião dos escravos, dos libertos, dos pobres, dos homens privados de direito e dos povos subjugados ou dispersos pelo Império Romano”.
Assim, o novo, que surge na década de 1970 quando a Teologia da Libertação é gestada não é a tal confluência entre cristianismo e socialismo – que de longe sempre tiveram mais coisas em comum do que uma improvável ligação entre o cristianismo e o capitalismo. Mas sim o fato de a Teologia da Libertação ter trazido a luta pelo Reino de Deus para a Terra, utilizando-se do marxismo como instrumento metodológico para combater as injustiças sociais criadas pelo capitalismo, já que para ela, o Reino está bem próximo, ou seja, é possível, está ao alcance de todos, aqui e agora.

Concílio Vaticano II (1962-1965)
Mas para que a Teologia da Libertação pudesse encontrar terreno fértil para lançar raízes nessa direção foi fundamental o aggiornamento propiciado pelo Concílio Vaticano II. De acordo com Clodovis Boff, “o Vaticano II significou a 'deseuropeização' da Igreja e a sua abertura verdadeiramente 'católica' [palavra de origem grega que significa universal] – fato que só encontra, na história, paralelo com a ruptura da Igreja Primitiva em relação à matriz hebraica e sua partida para o mundo grego”.
Dito em outras palavras, é como se o Concílio Vaticano II (1962-1965) – e não o Concílio de Trento (1545-1563) – fosse a esperada Contra-reforma Católica à Reforma Protestante, no que concerne à recuperação de uma ética cristã que, entre outras coisas, condena explicitamente a tese da predestinação de “alguns eleitos” e estende indiscriminadamente a salvação a todos, incluindo aqueles marginalizados e excluídos pela concentração capitalista decorrente da ideia salvífica em torno da vocação ao trabalho e, até mesmo, a não-cristãos.
Desse modo, a Teologia da Libertação surge, a partir de 1969, como prática pastoral latino-americana pensada em consonância com o Concílio Vaticano II, após essa orientação ter sido definida na reunião episcopal de Medellín (1968), o que preencheu o imaginário eclesial com a temática Libertação, e ter sido aprofundada em Puebla (1979), com a evangélica opção preferencial pelos pobres.  
Mas quem são os pobres?
Neste ponto, diante do marxismo, a Teologia da Libertação amplifica o conceito de “pobre”, indo ao encontro da compreensão que hoje ativistas antiglobalização também já desenvolveram.
 “Por 'pobre', na verdade, não estamos querendo dizer aquele indivíduo pobre que bate na porta pedindo esmolas. Estamos falando sobre o pobre coletivo, as “classes populares”, que são uma categoria muito mais ampla do que o “proletariado” escolhido por Karl Marx (é um erro identificar o pobre da Teologia da Libertação com o proletariado, apesar de muitos dos seus críticos o fazerem): os pobres são também os trabalhadores explorados pelo sistema capitalista; os subempregados, aqueles deixados de lado pelo processo produtivo – um exército de reserva sempre à mão para substituir aqueles que estão empregados; são os trabalhadores do campo, os trabalhadores migrantes sazonais”(1986), segundo esclarecem os irmãos Boff.
Neste sentido, aquela famosa frase do bispo brasileiro dom Hélder Câmara: “Quando dou comida ao pobres, me chamam de santo; quando pergunto por que os pobres não têm comida, me chamam de comunista” ganha contornos reais e metafóricos. De fato, até mesmo Che Guevara uma vez, em virtude da histórica religiosidade cristã do continente, sentenciou: “A revolução na América Latina só acontecerá quando os comunistas deixarem de ser preconceituosos com a fé dos cristãos; e os cristãos deixarem de ser proselitistas com os comunistas. Nesse dia, a revolução será imbatível”. Exemplo claro dessa associação a qual Che se refere foi a Revolução Sandinista (1979), na Nicarágua, que chegou a ter vários ministros de Estado ligados à Teologia da Libertação – inclusive padres.
Mas por que aparentemente a partir da década de 1990 a Teologia da Libertação parece entrar em refluxo? Teria o “espírito” da Teologia da Libertação simplesmente evaporado da cena política, como num passe de mágica, justamente quando tudo o que sempre esteve atrelado à sua agenda de resistência e libertação humana finalmente ganhou dimensões e conexões globalizadas?
Para se chegar a uma resposta plausível, alguns pontos precisam ser elencados. Em primeiro lugar, por não possuir caráter proselitista, a Teologia da Libertação sempre fomentou a secularização em seu sentido mais amplo, já com o propósito de que em algum momento o seu “espírito” viesse a se descolar da religião, ao incentivar a criação de organismos laicos para exercerem influência no mundo. Muitos movimentos sociais, a princípio, foram tutelados pela Teologia da Libertação, como por exemplo, o MST no Brasil e os zapatistas no México.

MST
Fundado oficialmente em 1984, desde 1979, o movimento contava com o apoio da Comissão Pastoral da Terra (CPT), órgão ligado à CNBB, que contribuía na organização dos sem-terra para que eles construíssem o seu próprio instrumento de luta.
Fora isso, a história não-oficial contada por Ademar Bogo, um de seus principais dirigentes – ele próprio um ex-seminarista – diz que a ideia de criação do MST surgiu “da cabeça” do já falecido bispo de Chapecó, dom José Gomes, alinhado à Teologia da Libertação, que mandou cinco ex-seminaristas se espalharem pelo país para iniciarem trabalhos de base com trabalhadores rurais.
A “mística” do Movimento, suas decisões em assembleias, a vida comunitária nos acampamentos e o estímulo ao trabalho em pequenas cooperativas ou coletivos são traços marcantes dessa herança.

Zapatistas
Algo semelhante aconteceu com os zapatistas. Em 1994, quando os insurgentes apareceram houve grande confusão. Foram, a princípio, descritos pelos meios de comunicação e pelo governo mexicano como inspirados pela Teologia da Libertação, enquanto dom Samuel Ruiz, o bispo de San Cristóbal de las Casas (Chiapas), era acusado de ser o guerrilheiro de Deus. Só depois soube-se que “foram militantes marxistas que criaram o EZLN, [e] que [este] não se refere ao cristianismo, mas antes à cultura maia”, como explica o sociólogo Michael Löwy, no ensaio A Teologia da Libertação acabou? (1996).
Tal “associação” entre marxismo e cristianismo na origem dos zapatistas não é completamente descabida. Dom Ruiz, autor de La teologia bíblica de la Liberación (1975), foi responsável por um trabalho de educação pastoral na região por muito anos – com a ajuda de jesuítas, dominicanos e de ordens religiosas femininas, o que resultou “numa vasta rede de 7.800 catequistas indígenas e 2.600 comunidades de base que contribuíram poderosamente para a conscientização das comunidades indígenas, ajudando-as a tomar conhecimento de seus direitos e a lutar para defendê-los”.
Além disso, há o detalhe de que o próprio subcomandante Marcos, se vier a ser mesmo Rafael Sebastián Guillén Vicente, como sustenta o governo mexicano, antes de começar a organizar os zapatistas, por volta de 1984, supostamente teria passado um tempo na Nicarágua à época da Revolução Sandinista, e que o próprio quando adolescente teria estudado no Instituto Cultural Tampico, um colégio privado ligado à Companhia de Jesus, na localidade de mesmo nome.
 
Transmutação
Um segundo aspecto inerente à Teologia da Libertação é que ela nasce com a intenção de desaparecer, de não ser mais chamada por este nome, por acreditar que quando o seu chamado fosse assimilado pela teologia como um todo, e que esta o fizesse o seu próprio chamado, então o seu nome poderia ser deixado de lado porque a esta altura todas as teologias seriam teologias da libertação do seu próprio jeito – pois caso contrário, não seriam teologias cristãs (Boff e Boff, 1986).
O chamado, como sabemos, sob o longo papado do conservador João Paulo II (1978-2005), não foi o esperado, mas sim o da “revaticanização” da Igreja latino-americana, com a censura à Teologia da Libertação, o afastamento de bispos progressistas e a nomeação de padres conservadores para os seus lugares. Assim, consequentemente, as CEBs foram forçadas a diminuir sua atuação política e a Renovação Carismática, patrocinada pelos Estados Unidos e incentivada pelo documento “Santa Fé II”, ganhou espaço.
Como consequência, a Teologia da Libertação não desapareceu como o previsto. Seus mártires continuam a dar seu sangue seguindo o caminho do padre guerrilheiro colombiano Camilo Torres (1966), do bispo de El Salvador Oscar Romero (1980), do padre brasileiro Josimo Tavares (1986), da freira estadunidense naturalizada brasileira Irmã Dorothy Stang (2005).
Mas o seu “espírito” ultrapassou os limites da igreja, transfigurou-se, em busca de lugares mais propícios ao seu chamado, e atua há algumas décadas em movimentos sociais nos quais é possível ver o Cristo no rosto e no corpo do excluído, do pobre, da mulher oprimida, do negro, do indígena, do desempregado. 
Posto isto, o apresentador populista conservador da Fox News citado no início desta  análise não deveria estar preocupado com os ensinamentos “demoníacos” da Teologia da Libertação, nem com o seu alegado comunismo, e muito menos com o “espírito” que move Obama. Mas sim com o “espírito” do cristianismo libertário que se desprendeu das amarras de sua esfera religiosa e que a cada dia ganha mais corações e mentes na América Latina.
Como disse Frei Betto, outro expoente da Teologia da Libertação em entrevista recente ao site desinformemonos.org: “Jamais haverá participação popular nos processos políticos latino-americanos sem incorporar a religiosidade do povo. Aqui a porta da razão é o coração e a chave do coração é a religião”. Oxalá esse “espírito” seja levado por correntes de vento em direção ao Norte e contamine logo os Estados Unidos por inteiro.
 Fonte: 
Marcelo Netto Rodrigues é ex-editor do jornal Brasil de Fato e cientista social.
http://www.brasildefato.com.br/node/4379






domingo, 11 de novembro de 2012

A Servidão Moderna



“De la servitude moderne” é um documentário com 52 minutos, teve o texto escrito na Jamaica em 2007 e edição finalizada na Colômbia em 2009, é distribuído gratuitamente em pontos alternativos da França e da América Latina e vem acompanhado de um livro que sustenta o conteúdo do vídeo.

O documentário "Da servidão moderna" desenvolve o conceito de "sistema mercantil totalitário", que é definida tanto pela ocupação de toda a vida social e íntima, mas também todo o espaço e sua submissão às mercadorias. É, portanto, o resultado de qualquer sistema totalitário, já que nada pode escapar a sua aderência. Enquanto isso, para esconder a nossa condição servil e demência de organização social como um todo, o fornecedor do sistema totalitário montou todo um aparato de mistificação.


"A servidão moderna é uma escravidão voluntária, consentida pela multidão de escravos que se arrastam pela face da terra.Eles mesmos compram as mercadorias que os escravizam cada vez mais.Eles mesmos procuram um trabalho cada vez mais alienante que lhes é dado, se demonstram estar suficientemente domados.Eles mesmos escolhem os mestres a quem deverão servir. Para que esta tragédia absurda possa ter lugar, foi necessário tirar desta classe a consciência de sua exploração e de sua alienação. Aí está a estranha modernidade da nossa época.
Contrariamente aos escravos da antiguidade, aos servos da Idade média e aos operários das primeiras revoluções industriais, estamos hoje em dia frente a uma classe totalmente escravizada, só que não sabe, ou melhor, não quer saber.  Eles ignoram o que deveria ser a única e legítima reação dos explorados. Aceitam sem discutir a vida lamentável que se planejou para eles. A renúncia e a resignação são a fonte de sua desgraça."

                 (França - Colômbia, 2009, 52min - Direção: Jean-François Brient)


     O objetivo principal deste filme é de por em dia a condição do escravo moderno dentro do sistema totalitário mercante e de evidenciar as formas de mistificação que ocultam esta condição subserviente. Ele foi feito com o único objetivo de atacar de frente a organização dominante do mundo.

    No imenso campo de batalha da guerra civil mundial, a linguagem constitui uma de nossas armas. Trata-se de chamar as coisas por seus nomes e revelar a essência escondida destas realidades por meio da maneira como são chamadas.  A democracia liberal, por exemplo, é um mito já que a organização dominante do mundo não tem nada de democrático nem de liberal. Então, é urgente substituir o mito de democracia liberal por sua realidade concreta de sistema totalitário mercante e de expandir esta nova expressão como uma linha de pólvora pronta para incendiar as mentes revelando a natureza profunda da dominação presente.

    Alguns esperarão encontrar aqui soluções ou respostas feitas, tipo um pequeno manual de “como fazer uma revolução?” Esse não é o propósito deste filme. Melhor dizendo, trata-se mais exatamente de uma crítica da sociedade que devemos combater. Este filme é antes de tudo um instrumento militante cujo objetivo é fazer com que um número grande de pessoas se questionem e difundam a crítica por todos os lados e sobretudo onde ela não tem acesso. Devemos construir juntos e por em prática as soluções e os elementos do programa. Não precisamos de um guru que venha explicar à nós como devemos agir: a liberdade de ação deve ser nossa característica principal. Aqueles que desejam permanecer escravos estão esperando o messias ou a obra que bastando seguir-la  ao pé da letra, libertam-se. Já vimos muitas destas obras ou destes homens em toda a história do século XX que se propuseram constituir a vanguarda revolucionária e conduzir o proletariado rumo a liberação de sua condição. Os resultados deste pesadelo falam por si mesmos.

    Por outro lado, condenamos toda espécie de religião já que as mesmas são geradoras de ilusões e nos permite aceitar nossa sórdida condição de dominados e porque mentem ou perdem a razão sobre muitas coisas. Todavia, também condenamos todo astigmatismo de qualquer religião em particular. Os adeptos do complot sionista ou do perigo islamita são pobres mentes mistificadas que confundem a crítica radical com a raiva e o desdém. Apenas são capazes de produzir lama. Se alguns dentre eles se dizem revolucionários é mais com referência às “revoluções nacionais” dos anos 1930-1940  que à verdadeira revolução liberadora a qual aspiramos. A busca de um bode expiatório em função de sua pertencia religiosa ou étnica é tão antiga quanto a civilização e não é mais que o produto das frustrações daqueles que procuram respostas rápidas e simples frente ao mal que nos esmaga. Não deve haver ambigüidade com respeito a natureza de nossa luta. Estamos de acordo com a emancipação da humanidade inteira, fora de toda discriminação. Todos por todos é a essência do programa revolucionário ao qual aderimos.

    As referências que inspiraram esta obra e mais propriamente dita, minha vida, estão explicitas neste filme: Diógenes de Sinope, Etienne de La Boétie, Karl Marx e Guy Debord. Não as escondo e nem pretendo haver descoberto a pólvora. A mim, reconhecerão apenas o mérito de haver sabido utilizar estas referências para meu próprio  esclarecimento. Quanto àqueles que dirão que esta obra não é suficientemente revolucionária, mas bastante radical ou melhor pessimista, lhes convido a propor sua própria visão do mundo no qual vivemos. Quanto mais numerosos em  divulgar estas idéias, mais rapidamente surgirá a possibilidade de uma mudança radical.

    A crise econômica, social e política revelou o fracasso patente do sistema totalitário mercante. Uma brecha surgiu. Trata-se agora de penetrar mas de maneira estratégica. Porém, temos que agir rápido pois o poder, perfeitamente informado sobre o estado de radicalização das contestações, prepara um ataque preventivo sem precedentes. A urgência dos tempos nos impõe a unidade em vez da divisão pois o quê nos une é mais profundo do quê o que nos separa. É muito fácil criticar o quê fazem as organizações, as pessoas ou os diferentes grupos, todos nós reclamamos uma revolução social. Mas na realidade, estas críticas são provenientes do imobilismo que tenta convencer-nos de que nada é possível.

    Não devemos deixar que o inimigo nos vença, as antigas discussões de capela no campo revolucionário devem, com toda nossa ajuda, deixar lugar à unidade de ação. Deve-se duvidar de tudo, até mesmo da dúvida.

    O texto e o filme são isentos de direitos autorais, podem ser recuperados, divulgados, e projetados sem nenhuma restrição. Inclusive são totalmente gratuitos, ou seja, não devem de nenhuma maneira ser comercializados. Pois seria incoerente propor uma crítica sobre a onipresença das mercadorias com outra mercadoria. A luta contra a propriedade privada, intelectual ou outra, é nosso golpe fatal contra a dominação presente.

    Este filme é difundido fora de todo circuito legal ou comercial, ele depende da boa vontade daqueles que asseguram sua difusão da maneira mais ampla possível. Ele não é nossa propriedade, ele pertence àqueles que queiram apropriar-se para que seja jogado na fogueira de nossa luta.

Jean-François Brient e Victor León Fuentes









sexta-feira, 12 de outubro de 2012

O som da Guerra Fria (1945-1991)

A Guerra Fria foi uma designação atribuída ao período histórico de disputas estratégicas e conflitos indiretos entre os EUA e a URSS marcada por uma bipolarização política, ideológica e militar do mundo pós II Guerra Mundial.


Características gerias da Guerra Fria:

- Corrida Armamentista e Nuclear;




- Guerras Locais;

Exemplo: Guerra das Coréias

- Bipolarização política, ideológica e militar;



- Uso da Propaganda;


- Alianças Militares;


- Corrida Espacial.


Confira abaixo a relação de músicas que foram composta no contexto da Guerra Fria e que ilustram o cenário geopolítico da metade do século XX.


1 - EUROPE -THE FINAL COUNTDOWN.



2 - THE BEATLES - Back in the USSR.



3 - Genghis Khan - "Moscow"



4 - Tears for Fears Everybody Wants to Rule the

 World legendado






5 - Bob Dylan - Blowin in the Wind.



6 - Men at Work - It´s a Mistake






7 - ELTON JOHN - Nikita 



8 - Imagine - John Lennon


9 - Scorpions - Wind of change


10 - Pink Floyd - Another Brick in the Wall


terça-feira, 25 de setembro de 2012

É Hora da Leitura: 1984


O livro 1984 é um romance distópico clássico do autor inglês Eric Arthur Blair, mais conhecido pelo pseudônimo de George Orwell. 
Terminado de escrever no ano de 1948 e publicado em 8 de junho de 1949, retrata o cotidiano de um regime político totalitário e repressivo no ano homônimo. No livro, Orwell mostra como uma sociedade oligárquica coletivista é capaz de reprimir qualquer um que se opuser a ela. 
A história narrada é a de Winston Smith, um homem com uma vida aparentemente insignificante, que recebe a tarefa de perpetuar a propaganda do regime através da falsificação de documentos públicos e da literatura a fim de que o governo sempre esteja correto no que faz. Smith fica cada vez mais desiludido com sua existência miserável e assim começa uma rebelião contra o sistema.
O romance se tornou famoso por seu retrato da difusa fiscalização e controle de um determinado governo na vida dos cidadãos, além da crescente invasão sobre os direitos do indivíduo. Desde sua publicação, muitos de seus termos e conceitos, como "Big Brother", "duplipensar" e "Novilíngua" entraram no vernáculo popular. O termo "Orwelliano" surgiu para se referir a qualquer reminiscência do regime ficcional do livro. O romance é geralmente considerado como a magnum opus de Orwell.



Documentário: 1984

7 tecnologias sinistras do livro "1984" que são uma ameaça na atualidade


O site Dvice preparou uma lista com sete tecnologias nascidas nas páginas do romance do escritor inglês e que, mais de meio século depois, ainda se constituem uma ameaça à privacidade e podem ser consideradas uma forma de controle social.


Teletelas espiãs

Em “1984”, quase todos os ambientes contavam com um dispositivo chamado “teletela”, que nada mais era do que uma espécie de TV que, de um lado, enviava imagens de propaganda para quem estava assistindo a ela e, de outro, servia como um instrumento de espionagem, captando tudo aquilo que a audiência estava fazendo.
 
Os televisores da atualidade não são espiões tão ativos quanto os descritos no livro, mas, se levarmos em consideração os tablets e notebooks, todos com suas câmeras embutidas, temos a sensação iminente de estarmos sendo vigiados. Além disso, recebemos mensagens publicitárias a todo instante e por todos os meios.


O Big Brother está de olho em você

Na obra literária, quem está por trás de todo esse controle é um “Grande Irmão”, conhecido como Big Brother. Essa “entidade superior”, na época, servia como uma metáfora de controle do governo sobre tudo aquilo que a população fazia.
 
Nos dias de hoje, na maioria das vezes não são os governos os grandes vilões, mas sim as corporações. Redes sociais e serviços de busca têm um controle total e absoluto sobre tudo aquilo que você pesquisa na internet. Essa informação pode ser usada contra você, criando novas ferramentas “viciantes” que possam induzi-lo a comprar mais ou passar mais tempo diante da tela do PC.


A polícia do pensamento

Se por qualquer razão alguma coisa fugisse do controle do Grande Irmão, ele poderia contar com uma série de aliados para denunciar pessoas que tivessem feito alguma coisa errada ou contra o sistema. Era a chamada polícia do pensamento.
 (Fonte da imagem: iStock)
Com câmeras de vigilância em todos os lugares, hoje é praticamente impossível fazer qualquer ação sem que alguma imagem sua seja gravada em algum lugar. Repare em quantos acidentes de trânsito, por exemplo, você viu nos últimos anos que, na hora de descobrir quem era o culpado, alguma imagem de câmera de segurança acabou sendo encontrada e denunciou o infrator. Estamos sendo vigiados em todos os lugares.

“Novilíngua”, a nova língua mundial

Para controlar a história, o governo criou uma nova língua mundial, substituindo palavras como “maravilhoso” e “esplêndido” para “bom mais”, fortalecendo assim a chamada “novilíngua”. Hoje, não podemos afirmar que exista necessariamente uma forma de controle sobre a língua, mas sabemos que as redes sociais e, principalmente, as mensagens de texto mudaram a forma como escrevemos.
 
Assim, c vc escreve de frma resumida nos sms, já dev ter percebido q, em alguns casos, qndo escreve de frma correta é visto com desconfiança por outras pessoas. A nova língua mundial da internet é recheada de expressões como “LOL” e “OMG”, e não entender qualquer uma delas pode significar a sua “exclusão” da vida digital.

Controle do passado, do presente e do futuro

“Quem controla o passado controla o futuro. Quem controla o presente controla o passado”. Um dos lemas políticos lançados no livro mostrava que alguns personagens passavam os dias modificando registros históricos em jornais e livros, modificando assim a história.
Boa parte das informações que consumimos hoje vem de fontes online que, nem sempre, são muito confiáveis. A Wikipedia, por exemplo, pode ser editada por qualquer pessoa, e a alteração de um detalhe histórico pequeno pode passar despercebida por muitos leitores, sendo levada adiante como verdade.

Privacidade nas compras? Não, obrigado!

Quantas vezes por dia você paga as suas compras em dinheiro? Certamente, se você mora em uma grande cidade, na maioria das vezes você utiliza o cartão de débito ou de crédito para efetuar as suas compras. Todas essas transações, quer você queira ou não, deixam um rastro que pode dizer muito sobre a sua personalidade.
 
Esse aspecto pode também ser encarado com uma alusão à obra de George Orwell, já que em “1984” as pessoas tinham as suas compras limitadas, podendo dispor de apenas alguns itens de extrema necessidade e descartando alguns supérfluos. A tecnologia NFC promete diminuir ainda mais o uso do papel moeda nas transações.


Teletelas nas ruas

Se dentro de nossas casas as televisões, os tablets, os notebooks e os PCs se encarregam de nos trazer mensagens publicitárias, nas ruas o mesmo já acontece. Grandes painéis de propaganda, em alguns casos animados, servem como grandes transmissores de informações, o que nos induz a adquirir mais produtos.
No mundo criado por George Orwell, essas mensagens eram recheadas de propagandas de guerra, mas o conteúdo, nesse caso, não importa muito. No final das contas, estamos condicionados a receber informações 24 horas por dia e sentimos falta quando isso não acontece. 

Fonte: Dvice 



Filme: 1984 

"Quem controla o passado
controla o futuro;
Quem controla o presente
controla o passado."


sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Misturar igreja com política “extrapola o ideario republicano”?

Na entrevista abaixo,  Ricardo Mariano observa que a Universal está envolvida com a política desde o final da década de 1980, participando diretamente de campanhas majoritárias e também para vereadores e deputados estaduais e federais, além de patrocinar a formação de partidos. A principal novidade deste ano, segundo o especialista, é o acirramento da disputa política, partidária e midiática entre evangélicos e carismáticos, o que resulta na ocupação religiosa da área pública num ritmo cada vez maior. Na avaliação dele, é um quadro que contraria o ideário republicano, que pressupõe a separação entre igreja e Estado, entre religião e política.




Mariano é doutor em sociologia pela USP e autor do livro "Neopentecostais: Sociologia do Novo Pentecostalismo no Brasil." Ele coordena o Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.



A seguir, os principais trechos da conversa com o estudioso extraído do site "Portal Vermelho" realizada pelo jornalista Roldão Arruda.


Roldão Arruda: Como o senhor vê o enorme destaque dado às igrejas evangélicas nas eleições deste ano?

Ricardo Mariano: O ingresso organizado dos evangélicos na política não é novo. Desde a segunda metade da década de 1980 ficou evidente o interesse desses religiosos pela política partidária, muito ávidos por recursos públicos, emissoras de rádio e TV, barganhas e alianças com candidatos e partidos e governantes. Eles participaram dos debates da Assembleia Constituinte, ajudaram o José Sarney a ampliar o mandato de quatro para cinco anos – em troca de concessões de emissoras e rádio e verbas públicas. No segundo turno das eleições de 1989, Fernando Collor de Mello conseguiu o apoio esmagador dos pentecostais contra a candidatura lulopetista. De lá para cá, a instrumentalização recíproca entre esses grupos, sobretudo pentecostais e neopentecostais, com candidatos, partidos e governantes tem se intensificado.

Roldão Arruda: Em 1989 eles fizeram campanha contra Luiz Inácio Lula da Silva.
Ricardo Mariano: No segundo turno. No primeiro, como existiam vários candidatos, dentro de um leque variado, que incluía Lula, Collor, Mário Covas, Ulisses Guimarães, Leonel Brizola, o ativismo eleitoral dos evangélicos não apareceu. Nenhum candidato conseguiu galvanizar seu apoio. No segundo turno, porém, havia o temor, estimulado pela candidatura do PRN (extinto partido de Collor), de que Lula, numa aliança diabólica com o setor progressista da Igreja Católica, iria tolher a liberdade religiosa. Falava-se que os templos seriam transformados em armazéns e que os evangélicos seriam perseguidos e fuzilados em paredões.
Roldão Arruda: Esses boatos tiveram repercussão nas outras vezes em que Lula se candidatou?
Ricardo Mariano: Sim. O mesmo temor apareceu em 1994 e 1998. Foi só em 2002, no segundo turno da eleição presidencial, que o PT conseguiu apoio evangélico pra valer entre igrejas pentecostais. A Igreja Universal do Reino de Deus declarou apoio a Lula, enquanto a Convenção Geral da Assembleia de Deus do Brasil, do Belenzinho, em São Paulo, ficou ao lado de José Serra (PSDB). O líder da Assembleia era malufista, mas, quando Paulo Maluf passou a ter presença rarefeita nas disputas eleitorais, ele passou a apoiar os candidatos do PSDB. Tem feito isso sistematicamente. Nunca apoiou o PT, nem vai apoiar.

Roldão Arruda: Qual a principal novidade que o senhor detecta em anos mais recentes?
Ricardo Mariano: A novidade é que a ala carismática católica agora também está empenhada na eleição de candidatos com identidade católica. Uma vez que o Vaticano proíbe o lançamento de candidaturas de padres e bispos, leigos estão sendo estimulados a se candidatar com plataformas baseadas na moral e na doutrina social da igreja. O crescimento pentecostal – do ponto de vista demográfico, institucional, partidário, político e midiático – levou a Igreja Católica a uma contraofensiva, a uma concorrência tanto religiosa, quanto midiática e política. Essa concorrência entre pentecostais e católicos estimulou a ocupação religiosa da esfera pública.

Roldão Arruda: Em que momento o senhor detecta o início dessa concorrência?
Ricardo Mariano: Até o início dos anos 90, a Igreja Católica não tinha emissoras de TV, muito menos redes. Mas, a partir de 1993, com a criação da Rede Vida, o quadro mudou: hoje os católicos têm três redes nacionais de TV e um número crescente de emissoras. Vale notar que a Igreja Católica já tinha a maior rede de rádios no País. Houve, portanto, um estímulo ao avanço na mídia eletrônica, sobretudo na TV.

Roldão Arruda: E isso extrapolou para a política?

Ricardo Mariano: Sim. Há um ativismo crescente nas eleições e na política partidária, ainda que, tradicionalmente a Igreja Católica se apoie mais em seu lobby para a defesa de interesses institucionais e morais.


Roldão Arruda: Como vê essa ocupação religiosa da esfera pública?

Ricardo Mariano: Olhando as principais ideologias do século 19, o socialismo, o positivismo, o liberalismo, o republicanismo e outras, observamos que todas propõem a autonomia do Estado e da política em relação à religião. O socialismo e o positivismo previam, inclusive, o fim da religião. O liberalismo e o republicanismo sempre tiveram como meta o estabelecimento de uma autonomia recíproca entre Estado e igreja, religião e política. Havia um esforço para a criação de valores laicos, seculares, em torno da cidadania, da república, das liberdades democráticas.

Roldão Arruda: E o caso brasileiro?
Ricardo Mariano: Nossa república também nasceu sob esse signo. O modelo que adotamos foi um mix dos modelos francês e americano, com separação entre igreja e Estado. Até o fim do Império, o catolicismo era a religião oficial do Estado e também era tutelada por ele, o que significa que não tinha plena liberdade de ação. Com a constituição republicana ela passa a ter liberdade de ação e adquire um poder imenso, na Primeira República. Para a Constituinte de 1934 foi criada a Liga Eleitoral Católica, que elegeu muitos representantes da própria igreja. Em seguida, no texto constitucional, ela conseguiu uma série de privilégios. Um dos mais importantes foi o princípio de colaboração recíproca entre igreja e Estado em benefício do chamado bem comum. Isso foi mantido na Constituição de 1988, embora com outra formulação. No mesmo artigo em que aparece a separação entre igreja e Estado, vedando a concessão de subsídios e a realização de alianças com grupos religiosos, aparece esse princípio da colaboração. Nos anos 30, 40, 50 e outros, esse princípio de colaboração recíproca significou sobretudo uma série de subsídios para escolas católicas, hospitais, obras assistenciais.

Roldão Arruda: Não havia pluralismo religioso.
Ricardo Mariano: Nas últimas décadas, sobretudo a partir dos anos 80, é que o pluralismo religioso passa a vigorar de fato no Brasil e a Igreja Católica se vê tendo que competir no mercado religioso. Com o avanço pentecostal, os privilégios concedidos aos católicos começam a ser contestados.

Roldão Arruda: Não há reação a esse avanço do religioso sobre o público?
Ricardo Mariano: Há uma contestação crescente de setores laicos ou seculares da sociedade brasileira, envolvendo parte da imprensa, educadores, cientistas e ateus. Eles são minoritários mas estão se organizando. Os movimentos feministas e homossexuais aparecem entre os principais rivais dessa crescente ocupação religiosa da esfera pública, sobretudo no campo político partidário. Não é um movimento articulado, que junte todos esses grupos e movimentos, mas há uma grita crescente, defendendo sobretudo a laicidade do Estado. O mote central de todos os contestadores é a defesa da laicidade.

Roldão Arruda: Em São Paulo, nos últimos dias, surgiram notícias de igrejas transformadas em comitês eleitorais.
Ricardo Mariano: Isso não é de agora. Há algum tempo temos visto a transformação de templos em comitês eleitorais e fundação de partido por igreja. O Celso Russomano, em São Paulo, é filiado ao PRB, partido que foi criado pela Igreja Universal. O presidente do partido é da Universal e toda a base de cabos eleitorais dessa candidatura é de gente da Universal. São fiéis, pastores, obreiros da Igreja. É um negócio impressionante: você tem um igreja que criou um partido, que tem uma concessão pública, uma rede de TV, a segunda mais importante do País, apoiando um candidato que tinha um programa nessa TV e que foi lançado por esse partido.

Roldão Arruda: Como vê isso?
Ricardo Mariano: Legalmente, as igrejas estão proibidas de dar apoio eleitoral. Mas isso tem sido feito. A Igreja Universal apoiou o Collor em 1989 e teve problemas com a Justiça Eleitoral. Isso ocorreu também nas campanhas de Crivella (Marcelo Crivella, bispo da Universal, atual ministro da Pesca), no Rio, para prefeito e governador. Não é de agora que a Universal funciona como comitê, às vezes para candidaturas majoritárias, como nos casos de Collor, Crivella, Russomano, mas, sobretudo, para seus candidatos a vereador, deputado estadual e federal. A Universal elege uma bancada própria, composta por representantes de seu partido e de outras legendas. Quando se pensa na ideia de República, que pressupõe a separação entre igreja e Estado, entre religião e política, essa mistura que estamos vendo extrapola a lei e o ideário republicano.