Por Marcus Coimbra
Enquanto o sistema político só tem olhos para os recentes atritos
entre o PT e o PSB, as eleições municipais avançam, tensionando toda a
estrutura partidária. De quatro em quatro anos, a cada vez que chega a
hora de renovar a política local, isso acontece.
Por diversas razões. A mais importante é que a escolha de prefeitos e
vereadores tem consequências diretas nas eleições para o Legislativo.
Fortalecer-se nas cidades antecipa dias de glória para os partidos. Já
se foi o tempo em que bancadas estritamente “localistas” dominavam o
Congresso. Era a época em que quase todos os deputados e mesmo alguns
senadores tinham uma base eleitoral bem demarcada em termos geográficos.
Sua votação concentrava-se em alguns municípios, frequentemente
contíguos. Sem eles, não se elegiam.
Esses parlamentares estabeleciam uma relação de simbiose com as
lideranças políticas de “suas” cidades. Na hora da eleição legislativa,
prefeito e vereadores endossavam a candidatura do deputado e faziam a
sua campanha, em troca do compromisso de representar a cidade no plano
estadual e nacional, e buscar recursos para ela.
Dois anos depois, quando chegava a eleição
municipal, o parlamentar indicava seus candidatos, apresentando-os como
responsáveis por tudo de bom que houvesse acontecido na cidade e
ameaçando os eleitores com prejuízos se não vencessem. Era “toma lá dá
cá”: os prefeitos (e vereadores) ajudavam na eleição dos deputados e
esses contribuíam para a deles.
Hoje, o tamanho das bancadas eleitas por esse mecanismo diminuiu. Mas
elas continuam a existir. A ponto de alguns estudos sugerirem que a
adoção do voto distrital não alteraria drasticamente o perfil da Câmara,
tão expressiva é a parcela de deputados que provém de distritos
informais. Boa parte do chamado “baixo clero” chega assim ao
Legislativo. E é fundamental na formação de maiorias quando matérias
polêmicas são votadas.
Às vezes, a carreira legislativa desses parlamentares está
entrelaçada com a atuação na vida política local, em um vaivém entre
Brasília e a cidade de origem. Foram prefeitos, são deputados e podem
voltar a qualquer momento para a prefeitura, nada incomodados de sair da
capital federal. São políticos híbridos: deputados-prefeitos ou
prefeitos-deputados.
Seria um equívoco imaginar que o restante do Congresso pode se dar ao
luxo de ignorar as eleições municipais, dispensar o voto que bons
prefeitos e vereadores asseguram. Mesmo os parlamentares menos
localistas e mais ideológicos contam com eles para formar a cesta de que
precisam. Raros são os deputados e senadores que, pensando em suas
carreiras, não têm interesse nos resultados das eleições locais.
Não é por outra razão que o Congresso entra em recesso em julho e
permanece em “recesso branco” até outubro. As eleições de prefeitos e
vereadores são tão importantes que todos param de trabalhar em seus
gabinetes e vão à luta, tentando eleger seus candidatos.
Além do impacto concreto que têm na vida de cada
parlamentar, ao afetar suas chances de reeleição, elas são decisivas na
definição do equilíbrio de forças no Legislativo. O tamanho das bancadas
é o primeiro critério para definir a influência política e o chamado
“espaço administrativo” dos partidos, tanto no Congresso quanto no
Executivo.
Ter um deputado a mais pode garantir a Presidência da Câmara ou de
comissões importantes. A mesma coisa no Senado. Na base governista, pode
significar um (ou mais de um) ministério. Por esses motivos, é natural
que as relações entre os partidos fiquem tensas na véspera de eleições
municipais. O que está em jogo é o futuro da maioria dos parlamentares e
o poder na legislatura seguinte.
Por motivos óbvios, essas tensões não se manifestam apenas entre os
partidos que formam a base do governo. Na oposição, são iguais.
Apesar da insistência na discussão da “crise” entre PT e PSB,
fenômenos parecidos estão acontecendo esses dias nas relações do PSDB
com seus irmãos menores, o DEM e o PPS. Para não falar na briga do PSD
com os tucanos em algumas cidades, especialmente em Belo Horizonte, onde
o DNA serrista do partido o levou à oposição contra Marcio Lacerda
(PSB), que tem o apoio de Aécio.
O DEM é o mais chateado. Embora tenha candidatos bem colocados nas
pesquisas em cidades importantes, como Fortaleza e Recife, os tucanos
resolveram lançar candidatos próprios, reduzindo-lhes as possibilidades.
No Rio, fizeram a mesma coisa, enfraquecendo os dois partidos. Está tão
magoado que anda pensando em uma fusão com o PMDB.
Em suma: entre os políticos e, portanto, entre os partidos, quando
chegam as eleições municipais, é “cada um por si e Deus por todos!” Em
primeiro lugar, todos pensam em si mesmos. Quando terminam, com os
ânimos serenados, tudo volta ao normal – até a nova eleição.
Fonte: http://www.cartacapital.com.br/
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